Enfermeira e Professora

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Arujá, São Paulo, Brazil
Tenho muito orgulho de ser enfermeira e professora e poder contribuir no aprendizado e conhecimento de pessoas através do meu Blog.

Símbolo da Enfermagem

Símbolo da Enfermagem
Enfermeiros

23 de outubro de 2011

ADMINISTRAÇÃO PENITENCIÁRIA ABRE CONCURSO PARA 90 VAGAS DE ENFERMAGEM

ADMINISTRAÇÃO PENITENCIÁRIA ABRE CONCURSO PARA 90 VAGAS DE ENFERMAGEM

Fonte:
Coren-SP
A Secretaria da Administração Penitenciária de São Paulo (SAP) abriu concurso para preenchimento de 57 vagas de auxiliar de enfermagem e 33 de enfermeiro. A remuneração é de R$ 1.639,77 para enfermeiro e de R$ 956,26 para auxiliar de enfermagem.

O concurso faz parte da implantação de novo modelo de assistência à saúde do preso. Além de vagas para profissionais de Enfermagem, existem oportunidades para oficial operacional (80), assistente social (44), cirurgião-dentista (22), engenheiro ambiental (1), engenheiro civil (4) e nutricionista (15).

As vagas são para atuação nas cidades de Bauru, Campinas, Presidente Prudente, Ribeirão Preto, São José do Rio Preto, São Paulo, Sorocaba e Taubaté.

O valor da taxa de inscrição é de R$ 30 (nível fundamental), R$ 40 (nível médio) e R$ 65 (nível superior).

A inscrição para o concurso público pode ser feita até 31 de outubro no site da organizadora Vunesp. A avaliação será composta por prova objetiva de conhecimentos gerais e específicos, com realização prevista para o dia 4 de dezembro, no período da tarde.

Concurso Público para a cidade de Santa Isabel

Prefeitura de Itanhaém abre concurso com 18 vagas de técnico de enfermagem

Prefeitura de Itanhaém abre concurso com 18 vagas de técnico de enfermagem

A Prefeitura de Itanhaém (SP) abriu concurso público para contratação de 8 técnicos de enfermagem com carteira de habilitação de motocicleta (tipo A), e mais 10 vagas de técnico de enfermagem (Samu). As inscrições vão até 6 de novembro.

HOSPITAL DAS CLÍNICAS ABRE CONCURSO PARA 15 VAGAS DE AUXILIAR DE ENFERMAGEM

HOSPITAL DAS CLÍNICAS ABRE CONCURSO PARA 15 VAGAS DE AUXILIAR DE ENFERMAGEM

Fonte:
Coren-SP
O Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da USP abriu concurso público para contratação de 15 auxiliares de enfermagem sob regime celetista.

O salário é de R$ 777,25 por jornada de 30h semanais e atuação junto à Divisão de Enfermagem da Diretoria Executiva dos Institutos Central (6 vagas) e de Ortopedia e Traumatologia (9 vagas).

Os interessados devem imprimir e preencher formulário na página de seleções do HC até o dia 31 de outubro de 2011, anexando cópias do RG; diploma ou atestado de conclusão do Ensino Médio; cédula de identidade do Conselho Regional de Enfermagem (Coren) e comprovante de pagamento da taxa de inscrição no concurso, enviando a documentação ao Serviço de Recrutamento, Seleção e Movimentação de Pessoal da Divisão de Recursos Humanos do HC, por meio de carta registrada com aviso de recebimento (AR).

A previsão é de que sejam aplicadas provas escritas (múltipla escolha, cálculos de medicação e questões dissertativas) e prático-orais em dias, locais e horários a serem posteriormente divulgados.

A taxa de inscrição é de R$ 38,39.

18 de outubro de 2011

Concurso Público

ADMINISTRAÇÃO PENITENCIÁRIA ABRE CONCURSO PARA 90 VAGAS DE ENFERMAGEM

Fonte:
Coren-SP
A Secretaria da Administração Penitenciária de São Paulo (SAP) abriu concurso para preenchimento de 57 vagas de auxiliar de enfermagem e 33 de enfermeiro. A remuneração é de R$ 1.639,77 para enfermeiro e de R$ 956,26 para auxiliar de enfermagem.

O concurso faz parte da implantação de novo modelo de assistência à saúde do preso. Além de vagas para profissionais de Enfermagem, existem oportunidades para oficial operacional (80), assistente social (44), cirurgião-dentista (22), engenheiro ambiental (1), engenheiro civil (4) e nutricionista (15).

As vagas são para atuação nas cidades de Bauru, Campinas, Presidente Prudente, Ribeirão Preto, São José do Rio Preto, São Paulo, Sorocaba e Taubaté.

O valor da taxa de inscrição é de R$ 30 (nível fundamental), R$ 40 (nível médio) e R$ 65 (nível superior).

A inscrição para o concurso público pode ser feita até 31 de outubro no site da organizadora Vunesp. A avaliação será composta por prova objetiva de conhecimentos gerais e específicos, com realização prevista para o dia 4 de dezembro, no período da tarde.

16 de outubro de 2011

ENFERMAGEM EM ONCOLOGIA PEDIÁTRICA

Carla Gonçalves Dias
Enfermeira, gerente geral de Enfermagem do Instituto de Oncologia Pediátrica do GRAACC/Unifesp
carladias@graacc.org.br

3/10/2011

Desde a graduação, na Escola de Enfermagem da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp), na época Escola Paulista de Medicina, Departamento de Enfermagem, a enfermeira Carla Gonçalves Dias já sabia que sua atuação seria junto à criança. O contato com o câncer infantil veio por acaso, quando ela começou a trabalhar na Pediatria do Hospital São Paulo. Anos depois, sentindo a necessidade de se aprofundar nesta especialidade, na época pouco conhecida no Brasil, através do apoio da CNPq, morou por quatro anos no Canadá onde teve experiências profissionais em instituições de renome, como o Hospital for Sick Children, grande centro de assistência, ensino e pesquisa pediátrica da América do Norte.

Passados mais de 25 anos, a enfermeira, que é especialista em Pediatria, enumera as mudanças ocorridas na área oncológica e vê a atuação interdisciplinar como o grande mote para o sucesso do tratamento do câncer infanto-juvenil.

Gerente de Enfermagem do Instituto de Oncologia Pediátrica do Grupo de Apoio ao Adolescente e à Criança com Câncer (IOP-GRAACC/Unifesp), Carla Dias ergue sua bandeira pela desmistificação do conceito de cuidado paliativo. Nesta entrevista ela esclarece as mudanças propostas pela Organização Mundial da Saúde (OMS) e a importância desta ação junto aos profissionais da Enfermagem.

A capacitação do enfermeiro em oncologia pediátrica também é assunto abordado, uma vez que a especialidade vem crescendo cada vez mais. Assim como as taxas de incidências de neoplasias pediátricas aumentam significativamente, a cura cresce de maneira linear e é preciso que o profissional de Enfermagem tenha conhecimento técnico-científico para entender e atender a criança com câncer e família, em todo o seu processo saúde-doença.

Como a enfermagem oncológica surgiu na sua vida? Quando começou a trabalhar com pacientes com câncer infantil?
Cursei Enfermagem na Universidade Federal de São Paulo (Unifesp), antiga Escola Paulista de Medicina (EPM), e desde aquela época eu já sabia que minha área de atuação seria a Pediatria. Eu não tinha dúvidas, eu queria cuidar de crianças. Depois de formada, fui trabalhar na unidade pediátrica do Hospital São Paulo. Eu nunca trabalhei com o paciente adulto. Naquela época, em 1982, dos aproximadamente 47 leitos na pediatria (gastro, berçário, pneumo), quatro eram para crianças com câncer. Área muito pouco conhecida para a Enfermagem, na hora de dividir o cuidar entre os profissionais da unidade sempre havia resistência dos colegas, e eu sempre me prontificava para ficar com essas crianças. E foi assim que me deparei com o mundo do câncer infantil. Na graduação, muito superficialmente, eu tive contato com o câncer em crianças, mas nada que tivesse despertado o meu interesse. Trabalhando com essas crianças foi quando, realmente, eu comecei a me interessar por essa área. Foi quando conheci o Dr. Sérgio Petrilli, que atualmente é o diretor médico do Instituto de Oncologia Pediátrica (IOP/GRAAC/Unifesp), e naquela época trabalhava no Hospital A.C. Camargo e, voluntariamente, atendia as nossas crianças do Hospital São Paulo porque não tínhamos nenhum profissional docente com esta formação. Ele passava diariamente na unidade e nós também fazíamos o ambulatório.

E naquela época, como era a assistência?
Era uma realidade totalmente diferente da que temos hoje. As crianças ficavam em uma unidade geral de Pediatria. Para se ter uma ideia, na EPM não existia especialização na área médica e de Enfermagem. Não havia nenhum protocolo de enfermagem para a assistência. O cuidado era prestado com base nos protocolos médicos, mas eu sempre traçava como deveria ser a forma de cuidar da criança, mas sem a pretensão de criar protocolos, isso nós fazemos hoje. Naquela época nós queríamos mesmo era cuidar, desenvolver rotinas pontuais para a assistência daquele paciente. O tempo passou, o serviço foi aumentando, o número de pacientes e de médicos também, e nós precisamos ir atrás de infraestrutura. Criei um prontuário para os meus pacientes para facilitar o meu trabalho. Incluía todos os exames realizados e documentava minha atuação, pois diante da necessidade de termos mais enfermeiros que dessem continuidade ao trabalho, esses instrumentos facilitariam e garantiriam a continuidade da assistência. Nosso grupo de enfermagem reconheceu as necessidades específicas desta clientela. Outra grande mudança foi com relação ao acompanhante. Naquele tempo as mães não podiam ficar junto às crianças internadas, elas tinham que cumprir os horários de visitas. Mas era nítida a necessidade de a mãe acompanhar seu filho, ficar junto, não porque a criança poderia morrer, muito pelo contrário, mas porque ela precisava de continuidade no tratamento e no cuidado. A criança recusava a comida por causa da quimioterapia, por exemplo, por estar mais nauseada, e neste aspecto ter tempo e paciência para estimulá-la a se alimentar era vital para o sucesso do tratamento. E foi através de nosso trabalho com essas crianças que a rotina de toda a Pediatria sofreu mudanças, e para melhor. Com o passar do tempo, toda a unidade enxergou a necessidade de a criança ter um acompanhante durante a sua internação. Hoje, esta é uma implicação inserida no Código dos Direitos da Criança e do Adolescente. Este foi o início de uma série de mudanças naquela época, trabalhar em cima de fatos relacionados àquela clientela e mostrar aos colegas que tudo tinha uma causa, uma necessidade reconhecida. Tivemos que desconstruir o mito de que se a mãe/ pai ficasse junto ao filho é porque a criança ia morrer. Mudamos uma história e mostramos que o melhor cuidador para a criança com câncer era a mãe/familiar, que ela era importante no tratamento, que ela fazia um vínculo, uma parceria. Nós mudamos uma história e o espaço físico acabou ficando pequeno para atender aos pacientes infantis com câncer.
Outra grande mudança foi que transferimos as crianças do ambiente "adulto" da quimioterapia ambulatorial, pois esta era realizada em um mesmo espaço, juntos, não sendo apropriado nem para as crianças e nem para os adultos, pois apresentam diferentes necessidades a serem atendidas pela equipe de enfermagem. Um exemplo simples que foi facilmente detectado pelos pacientes/familiares e também pela equipe, foi a especificidade do tratamento proposto e as demandas geradas, as características das diferentes faixas etárias e o conhecimento técnico e científico necessário para o cumprimento das boas práticas na assistência desta população tão especial.

A senhora fez especialização na área de pediatria e buscou conhecimento em oncologia infantil fora do Brasil. Como foi esta experiência?
Em 1985, fiz especialização em Pediatria no Departamento de Enfermagem (EPM) e embora eu trabalhasse exclusivamente com crianças com câncer, sentia falta da formação mais especifica nesta área, eu precisava aprofundar o olhar da enfermagem, fundamentado no conhecimento científico. Nesta época, apresentei ao CNPq um projeto pedindo uma bolsa de especialização em oncologia pediátrica para enfermeiro. Ganhei a bolsa e fiquei por quatro anos em Toronto, no Canadá, período em que tive oportunidade de conhecer vários hospitais e programas para o tratamento do câncer infanto-juvenil. Como naquela época eles ainda não tinham tido demanda de enfermeiros estrangeiros, eu tive que criar o que eu acreditava ser um programa ideal, com o objetivo de complementar e aperfeiçoar a minha formação, em todas as áreas que envolvem o tratamento do câncer e a assistência a esta clientela. O primeiro hospital que eu freqüentei era de pacientes adultos com câncer, porque os hospitais que atendiam crianças nunca tinham recebido uma enfermeira do Brasil, e não entendiam qual era a minha formação. O The Princess Margaret Hospital abriu as portas para me receber e através da educação continuada de enfermagem deste hospital criaram um segundo programa no SickKids, um dos maiores e mais respeitados centros de saúde pediátrica da América do Norte.
Não poderia ter sido melhor, pois eu tive um ganho de conhecimento intensivo em câncer adulto, passando por áreas como radioterapia, ambulatórios, internação, transplante de medula óssea. As enfermeiras coordenadoras de Educação Continuada dos dois hospitais, que eram conhecidas profissionalmente, criaram um programa para mim. Fiquei dois anos envolvida neste programa, fiz curso de capacitação em quimioterapia, tenho certificado da Universidade de Toronto, inclusive. E daí acabou minha bolsa pelo CNPq e acabei me casando por lá. Como enviava rotineiramente relatórios de planejamento e das minhas atividades, assim como de avaliações as quais fui submetida, para o acompanhamento da EPM (Unifesp), foi possível solicitar licença não remunerada para a Instituição, que através da análise destes conteúdos, liberou-me para ficar mais tempo no Canadá, com o compromisso de retornar à Universidade e contribuir para a implementação e a qualidade da assistência de enfermagem a criança e adolescente com câncer.
Fiquei quatro anos por lá e fiz outras coisas que nem mesmo imaginei que pudesse fazer. Fiquei um ano como enfermeira de pesquisa e mais seis meses no grupo da dor, o que gerou em mim a vontade de trabalhar a dor em crianças com câncer. Fiquei colada em uma enfermeira que coordenava o grupo de dor crônica dentro do SickKids.
E assim eu nunca mais saí de um hospital pediátrico.

Como nasceu o Instituto de Oncologia Pediátrica/Unifesp, do qual você é uma das percussoras?
Com todas as mudanças na Unidade de Pediatria, sentimos a necessidade de sair do prédio do Hospital São Paulo porque não cabíamos mais lá. Alugamos uma casa para fazer a parte de Hospital Dia e internávamos no hospital somente aqueles pacientes com necessidades clínicas. A primeira casa foi alugada exatamente no espaço que hoje é o IOP, na Vila Clementino, cidade de São Paulo. O espaço físico atual é o de cinco casinhas germinadas. Construímos o nosso ambulatório em 1991. As crianças vinham para este espaço, passavam em consulta, recebiam a quimioterapia. Eu ficava neste ambulatório e passava visita aos internados todos os dias. Nesse período foi criado GRAACC (Grupo de Apoio ao Adolescente e à Criança com Câncer), ONG que sustentou financeiramente este projeto. Foi o GRAACC quem alugou e reformou a casa. Eu vi o GRAACC nascer e faço parte da assembleia dos sócios fundadores do Grupo. O Instituto de Oncologia Pediátrica (IOP) é o hospital do GRAACC.
O ambulatório foi crescendo, a equipe foi aumentando, os pacientes foram chegando, e já contávamos com três leitos que chamávamos de pernoite, porque eram crianças que precisavam ficar em observação e a gente tinha enfermagem (auxiliar) que ficava à noite junto a esses três leitos. A enfermeira e um médico ficavam com um bip para serem acionados a qualquer necessidade. Hoje eu penso como nós fomos arrojados, embora tivéssemos toda uma avaliação clínica e a garantia de que não se tratava de crianças clinicamente instáveis.
No final de 1996, a ONG estava tão forte que tinha verba para construir o prédio que hoje é o IOP, e assim nos tornamos um centro de oncologia pediátrica, embora ainda com algumas limitações.
De lá para cá, o prédio ficou pronto, tomamos posse, começamos com ambulatório e muita coisa ficava no Hospital São Paulo, abrimos a quimioterapia, o centro cirúrgico, depois a UTI, a internação. Fomos contratando enfermeiros e auxiliares, na época auxiliares, hoje somente técnicos. As pessoas traziam seus currículos e nós da enfermagem recrutávamos os profissionais. A Educação Continuada antes era informal. Nós íamos para o campo e mostrávamos como "queríamos" que fosse feito, a gente ia ensinando o profissional, mas não tínhamos implantado este serviço. Quando nos estruturamos, a enfermeira Ana Lygia Pires Melaragno foi convidada para vir para cá e montar as normas e rotinas, o processo seletivo, como se avalia os profissionais, enfim, hoje, tudo o que se faz dentro da instituição é baseado na Educação Continuada, que já tem dez anos.

Quais as suas percepções e sentimentos relacionados à oncologia pediátrica?
O mais sedutor de escolhermos esta área é que todos nós temos responsabilidades no cuidado e na assistência à criança e à sua família. E o conceito de família está mudando, não é como antigamente, hoje não é mais o pai-mãe-filhos. As famílias hoje são compostas só de pais, só de mães, seus filhos, nossos filhos, duas mães, dois pais. A enfermagem precisa ser dinâmica e precisa adaptar-se rapidamente às necessidades, aos novos conceitos de família. Nós não somos um grupo estático, nós somos profissionais dinâmicos que utilizam os recursos da interdisciplinaridade. Por exemplo, eu preciso do serviço social, pois como eu posso trazer a criança para o ambulatório/hospital dia se a família não tem condições financeiras para pagar o transporte todos os dias? Nesta questão a assistente social é de fundamental importância. A nutricionista também é parte indispensável, porque a criança não pode desnutrir, não pode ficar obesa, porque senão eu vou ter que mexer no protocolo do paciente, na dose da medicação que é calculada sobre a superfície corpórea (relação peso/altura) do paciente. É fundamental a reabilitação, pois as cirurgias são complexas, e o conceito não é curar a qualquer preço, mas sim curar com qualidade de vida, devolver esta criança para a sociedade de forma que ela esteja ativa, assim ela precisa ser reabilitada, ser reinserida no seu meio. A psicologia é muito importante, assim como o suporte espiritual porque não adianta curar o corpo se, nesse processo da cura, a alma for destruída. Existem trabalhos na literatura mostrando suicídio de adultos jovens que tiverem doenças crônicas na infância e que não souberam lidar com a vida fora do hospital, ele foi privado por tanto tempo da vida fora do hospital que depois não se adaptou à vida social, então a reabilitação como um todo é fundamental.

“o conceito não é curar a qualquer
preço, mas sim curar com qualidade
de vida”

Como cuidar do paciente com câncer infantil?
O tratamento deve ser global, devemos cuidar dos aspectos biopsicossociais, espirituais e culturais de nossos clientes, pois o processo do câncer infantil, a partir do seu diagnóstico, costuma ser longo e doloroso, faz com que a criança se afaste da escola, dos amigos, até mesmo dos familiares, a criança é tirada de seu cotidiano, ela é inserida em um mundo até então desconhecido, que é o das injeções, das sessões de quimioterapia, das internações e consultas rotineiras. Elas têm inseguranças, mas continuam sendo crianças e necessitam de um cuidado mais humano, que não vise apenas o tumor, o fisiológico. Enquanto profissionais precisamos garantir a esta criança que as suas necessidades, enquanto ser em pleno desenvolvimento e crescimento sejam reconhecidas e correspondidas integralmente.

Como deve ser a visão da enfermagem?
Por estarmos vinculados a uma universidade, somos constantemente chamados para dar palestras, aulas, em todo o Brasil. Em todas essas oportunidades, sempre falo que se os profissionais guardarem apenas uma frase de minha aula já terá valido a pena. E essa frase tão primordial é: “a criança pode ter câncer”. Se o enfermeiro recebe uma criança e constata que ela está pálida, com dor óssea, com histórico de febre, emagrecimento abrupto, e dentre os possíveis diagnósticos ela também pensar que esta criança pode ter leucemia, e se o médico também pensar, esta criança, através de um diagnóstico precoce, pode ter melhores chances de cura. Se o médico não pensar, a enfermeira pode, sim, e deve levantar esta hipótese e sugerir um aprofundamento nos exames diagnósticos. O tratamento de um tumor pequeno tem um prognóstico efetivamente melhor. Aplicar seu conhecimento com o de outro profissional é a verdadeira prática da interdisciplinaridade. Não existe mais o “isso é do enfermeiro” ou “isso é do médico”, pelo menos aqui em nossa instituição. Todos os profissionais envolvidos no atendimento à criança e ao adolescente podem sugerir, podem questionar, esta é uma prática diária nossa. Dentro desta especialidade o enfermeiro deve, sim, participar de todas as fases do tratamento, iniciando-se ao diagnóstico.

“Aplicar seu conhecimento ao de outro
profissional é a verdadeira prática da
interdisciplinaridade”

Como é feita a admissão deste paciente no IOP?
Nós só recebemos pacientes referendados por outra instituição de saúde, ou seja, crianças que iniciaram um processo de investigação diagnóstica em outro serviço de saúde. Elas são encaminhadas ao IOP/GRAACC com o diagnóstico de câncer ou mesmo suspeita da doença. Também recebemos pacientes encaminhados pelo PS do Hospital São Paulo. Com a educação em saúde e diagnóstico precoce em foco, o número de crianças que batem à nossa porta com suspeita de câncer é menor do que as que, de fato, têm a doença. No ano passado, nós recebemos 900 casos para atendimento na triagem e desses 600 não eram câncer. Antes nós recebíamos pacientes com tumores gigantescos, mas esta realidade está mudando. Hoje, o pediatra encaminha a criança a um serviço de oncologia quando suspeita que pode ser câncer. Houve uma época em que recebíamos mais pacientes de outras cidades, mas com a abertura de outros centros de oncologia infantil, este atendimento foi distribuído e, hoje, somente 40% dele são crianças de outras cidades.

Conte-nos um pouco sobre a estrutura e o atendimento do Instituto de Oncologia Pediátrica-GRAACC/Unifesp?
O Hospital do GRAACC, como é conhecido o IOP, tem como missão “garantir às crianças e adolescentes com câncer, dentro do mais avançado padrão científico, o direito de alcançar todas as chances de cura com qualidade de vida". Inaugurado em 1998, é referência nacional na área da oncologia pediátrica e também em capacitação dos profissionais de Enfermagem, uma vez que todos os colaboradores mantêm alguma atividade na assistência direta ao paciente, mesmo os enfermeiros que possuem cargo de Gerenciamento ou Gestão. Desta forma a gente possibilita que estes profissionais não se distanciem da parte clínica, e isso promove mais qualidade para a assistência. A equipe de enfermagem é composta de 145 profissionais – 53 enfermeiros e 92 técnicos - responsáveis pelos 29 leitos da instituição, 1.800 atendimentos ambulatoriais ao ano, 1.300 cirurgias, 40 transplantes de medula óssea e 12 mil sessões de quimioterapia. A cada ano o IOP realiza mais de 22 mil consultas interdisciplinares. Vale acrescentar que nosso hospital foi pioneiro na implantação da Quimioteca e do Hospital Dia na oncologia pediátrica e que ele é referência também em atendimento ambulatorial. Aqui a enfermagem também tem sua contribuição uma vez que orienta com competência família e paciente a respeito dos cuidados domiciliares. A faixa etária de atendimento vai de 0 a 25 anos, adultos jovens e também adultos não tão jovens, pois a filosofia não é tratar a faixa etária, mas sim tratar um paciente que tem um câncer característico da infância e da adolescência. Se um paciente tiver, por exemplo, um tumor característico da infância e por alguma razão este câncer surge na idade adulta, ele vem buscar atendimento aqui, onde a especialidade é a doença de crianças e adolescentes. Se, por exemplo, uma criança que se tratou aqui de um osteossarcoma e depois de 15 anos venha desenvolver outro tumor, como um câncer de mama, por exemplo, ela deverá ser tratada por um grupo de mama e não aqui. Sabemos que, atualmente, 70% dos nossos pacientes serão curados. Hoje, 50% do nosso gasto vêm do SUS e o restante vem de doação. Todo o dinheiro que a ONG investe aqui dentro vem de doadores fixos.

A Enfermagem do IOP desenvolveu algum protocolo inovador que serviu de modelo para outras instituições?
Um exemplo bem divulgado há bastante tempo é um instrumento desenvolvido pela enfermeira Cristiana Tanaka para controle ambulatorial de um grupo de pacientes que recebem uma droga chamada metrotexato (MTX) em altas doses. No mundo todo, estes pacientes adolescentes precisam ser internados para receber esta medicação, por conta do controle pós-medicação. Ela desenvolveu um instrumento que permite que a família seja ensinada e orientada a fazer isso em casa. Desde aquela época, creio que 1998, nós usamos este instrumento em todos os protocolos que incluem esta droga. Inclusive, já o apresentamos em vários congressos internacionais. Nosso papel enquanto enfermeiros é primeiramente identificar se a família tem condições de fazer este tratamento em casa e, em caso positivo, é a enfermagem quem senta junto com a família, e olho no olho, ensina a mãe a preencher este instrumento, que é uma folha de orientação. Isso é fruto da enfermagem baseada em evidência. Só é possível porque se faz isso continuamente, dia após dia, lapidando este instrumento ao longo dos anos. O controle é muito rígido e o enfermeiro acompanha o paciente diariamente. Além disso, o sangue é dosado para se ter a certeza de quanto ainda há de medicamento no organismo do paciente. Se não houvesse esse trabalho da Enfermagem, estas crianças ficariam internadas por até 92 horas.

Quais são as principais dificuldades do dia a dia da equipe de Enfermagem do Hospital?
A maior dificuldade é a rotatividade do profissional de nível técnico, por causa da dupla jornada. Aqui, 90% dos nossos funcionários têm dupla jornada de trabalho. Embora tenhamos um salário que compete com o mercado, quando comparado a instituições particulares, nós estamos em desvantagem e o profissional acaba optando pelo outro serviço. O volume de trabalho que temos é maior, porque as prescrições têm muito mais medicamentos, os pacientes requerem muito mais cuidados de enfermagem e, consequentemente, aqui tem um volume maior de trabalho. Em uma unidade de internação nosso dimensionamento de pessoal é de quatro pacientes por técnico em Enfermagem e 12 pacientes por enfermeiro, no máximo.

Há legislação específica para o cuidado de enfermagem a pacientes com câncer?
Esta é outra dificuldade, porque nós não temos nenhuma legislação específica para a oncologia e nem para a oncologia pediátrica. Nós temos somente algumas resoluções do Cofen que pontuam a atuação do enfermeiro em áreas como quimioterapia, radioterapia e transplante de medula.

E o que a sua instituição promove para a equipe de enfermagem que está na linha de frente desse campo de batalha, afinal ‘quem cuida de quem cuida’?
Desde o passado sempre percebemos que existia uma dificuldade muito grande em se relacionar com o paciente crônico, cujo tratamento é longo, onde você convive meses ou anos com aquela pessoa e acaba criando-se um vinculo, não só com o paciente como também à sua família. Esse vínculo gera estresse e sofrimento nos profissionais da equipe e aumenta a dificuldade em lidarmos com a finitude. Sempre foi uma questão crucial “cuidar de quem cuida”.
Anos atrás, quando ainda éramos uma casinha e ninguém falava de burnout, o pediatra psicanalista Paulo Schiller propôs que fizéssemos um grupo de discussão multiprofissional sobre as dificuldades que nós tínhamos em lidar com o paciente e sua família, e até mesmo entre nós profissionais. Lembro-me que essas reuniões eram às quintas-feiras, pela manhã, e de início eram muito frequentadas. Com o passar dos encontros, o grupo foi minguando e o que percebemos é que é muito difícil você se expor perante os colegas de trabalho. Como eu posso falar que tenho dificuldades em trabalhar com você, que não gosto da maneira como você lida com determinada família, que acho que você é indiferente, que não beija e nem abraça o paciente, se na hora do almoço eu me encontro diariamente com você? Isso era se expor demais e não dá para esperar este grau de maturidade de todo um grupo. Claro, as reuniões deixaram de acontecer.
Expliquei tudo isso para contar que começamos há pouco tempo um grupo de perdas e luto aqui no IOP. Neste grupo uma psicóloga de fora da Instituição discute a questão do lidar com o paciente que morre, com crianças graves, com toda a dinâmica que envolve o tratamento da criança e da família. A adesão dos profissionais ao programa é voluntária, mas este projeto surgiu de uma solicitação dos próprios profissionais. Todos os anos fazemos levantamento das necessidades de treinamento e um dos tópicos que mais apareceram foi a dificuldade de lidar com a perda do paciente, e os próprios funcionários sugeriram que eles tivessem ajuda de um profissional específico para isso, que viesse para cuidar deles e não tivesse vínculo com os pacientes e nem com a instituição. Não temos ainda como medir a funcionalidade do programa, mas a adesão está muito boa. Hoje, infelizmente, crianças ainda morrem. Recebemos uma média de 300 pacientes novos por ano e sabemos que 30% deles não alcançarão a cura. Isso representa 90 crianças por ano, o que é um número muito grande de perdas.

“Sempre foi uma questão crucial este
“cuidar de quem cuida".”

Como era no Canadá? Havia algum programa?
O que é prática lá, que também é aqui no IOP, são as reuniões multiprofissionais aonde se discute questões relacionadas ao paciente, à família e a todos os envolvidos no cuidado e no tratamento. Aqui no Hospital nós temos às terças-feiras reunião do Grupo de Cuidados Paliativos, que deixa o anfiteatro lotado, e às quintas-feiras com o Grupo da Dor, momento em que discutimos não somente a dor física, mas a psicológica, a emocional, a espiritual, social e cultural. E quando você discute estas questões aparecem os pontos nevrálgicos, e isso é bárbaro porque cada um que expõe alguma questão faz com que o grupo a discuta e a torne homogênea, com a mesma linguagem. No Canadá eles não trabalham com o psicólogo como nós trabalhamos. Quem faz este papel é a assistente social, que tem uma formação mais ampla do que a nossa. É a assistente social quem trabalha as questões específicas da família.

Qual é o perfil do corpo de Enfermagem para atuar nesta área?
Eu acredito que para ser enfermeiro, independente da área, da especialização, ele já é uma pessoa diferente, pois precisa ter um olhar despido do outro ser humano. Em oncologia pediátrica é preciso gostar de criança, é preciso ter empatia pelo ser que está ali, pois é somente por meio desta empatia que você estará sensível às necessidades de seu cliente. Para se trabalhar num hospital de oncologia pediátrica é importante que o profissional de Enfermagem entenda o perfil desta especialidade e dos pacientes atendidos. É um perfil totalmente diferente, tanto da oncologia de adultos, quanto da pediatria não oncológica, até mesmo porque as crianças respondem ao tratamento de uma maneira totalmente diferente da dos adultos. O profissional de enfermagem somente permanece nesta área se entender a amplitude de seu trabalho em todas as fases do tratamento oncológico. No momento da contratação, nós procuramos profissionais que tenham manifestado de alguma forma o interesse pela oncologia pediátrica, mesmo que ele chegue aqui recém-formado. Não importa, mas é necessário que ele tenha feito um estágio na área durante a graduação, que tenha tido contato com pacientes com esta patologia, que tenha, ao menos, aptidão para lidar com o câncer infantil. Ele precisa sinalizar em algum momento que gosta de cuidar de crianças e que tem interesse por esta área da saúde, principalmente para o cargo de enfermeiro. Por ser uma especialidade nova, não temos como exigir que o candidato tenha experiência e nem mesmo especialização. Já aconteceu de termos colaboradores que não se sentiram à vontade para este cuidar e pediram demissão. Buscamos no profissional o interesse pela oncologia pediátrica, tentamos no processo seletivo identificar quem tem perfil mais adequado, porém, não é freqüente, mas pode acontecer de admitirmos um profissional que não consiga desenvolver a atividade do cuidado junto ao paciente com câncer infantil. E não podemos exigir isso dele. Cuidar da criança com câncer e o conhecimento específico ele adquiri aqui dentro do IOP, mas não temos como ensiná-lo a gostar deste paciente tão especial.

O Hospital promove capacitação para seus colaboradores e para profissionais de fora?
A Educação Continuada do IOP desenvolve cursos de capacitação para os nossos funcionários e temos aberto também cursos onde participam profissionais que atuam em outros centros de tratamento de câncer em todo o Brasil. Alguns treinamentos e cursos nós abrimos para alunos de graduação, geralmente da Unifesp. Não temos esta especialização ainda, mas temos a parceria com a Universidade. Há o curso de Especialização em Oncologia, que é da Escola de Enfermagem (Unifesp), e dentro desse módulo há uma parte que é pediatria geral, que convida enfermeiros nossos para darem aulas. Dentro deste grupo de alunos, quem demonstra interesse na área pediátrica pode vir fazer um estágio de observação dentro do IOP. Talvez, no futuro, nós possamos criar um curso de especialização em oncologia pediátrica para enfermeiros, com a parceria da Unifesp. Vale incluir ainda que todos os profissionais que entram na instituição passam por um treinamento que tem como foco principal as ações de Enfermagem no cuidado à criança e ao adolescente com câncer. Esta área é muito específica e há poucas universidades que abordam a especialidade em sua graduação, por isso não podemos esperar que o profissional chegue aqui com conhecimento, mas precisamos que ele tenha interesse pela causa. Além do treinamento admissional, todos os enfermeiros passam por programas de capacitação em quimioterapia e manipulação de cateteres venosos centrais, além de um curso básico de oncologia pediátrica, realizado anualmente.

Existe Residência nesta área?
Existe Residência em Oncologia Pediátrica realizada na Escola Paulista de Enfermagem (Unifesp). É uma residência aprovada pelo MEC e contempla várias áreas da Enfermagem. Nós tivemos uma experiência de 2001 a 2005 e agora em 2010 retomamos a parceria. Por uma limitação da Universidade não teremos a Residência em 2012. Foi um projeto maravilhoso, formamos quatro residentes nos quatro primeiros anos e ficamos com essas quatro profissionais por vários anos atuando no IOP. Hoje temos duas residentes do segundo ano e três residentes que estão no primeiro ano.
O programa compreende dois anos de residência, com uma parte do conteúdo visando à oncologia geral e uma boa parte do conteúdo voltado para a oncologia pediátrica. Os alunos aprendem desde o momento do diagnostico até o final do tratamento, participando de todo o processo saúde-doença. É um programa bem extenso, composto de parte teórica e prática, que acreditamos ser a formação ideal para o profissional especialista.

Quais as mudanças mais latentes a senhora sentiu ao longo desses anos de cuidado ao paciente oncológico?
A primeira delas, com certeza, foi o acesso ao conhecimento e à informação. Você tem acesso à internet, a pesquisas, a trabalhos nacionais e internacionais, ou seja, só não estuda e não se atualiza quem não quer.
Outra coisa importante é a forma como o câncer foi e é encarado. Hoje se fala sobre câncer. Antigamente, quando comecei nesta área, a palavra câncer não era pronunciada nem mesmo pelos familiares do paciente. Falava-se “aquela doença”, esse preconceito ainda existe, porém é muito menor. Hoje pessoas da mídia falam que têm câncer, se expõem na televisão e isso é muito importante, causa um grande impacto na população. O livro “A Doença como Metáfora” diz que só com o surgimento de uma doença mais avassaladora para que se comece a desmistificar a anterior. E isso é uma verdade. Precisamos da Aids para começar a falar de câncer. A luta contra a ignorância maciça é importante, e percebo esta vitória nos dias atuais. Hoje somos reconhecidos como uma especialidade, ou seja, se existe enfermagem só para criança com câncer é porque existem crianças com câncer. Este é a segunda mudança!
E a terceira mudança é o princípio da multidisciplinariedade. Quando eu comecei a atuar na área não tínhamos com quem dividir. Nós éramos sozinhos correndo atrás de tudo e de todos. Hoje a oncologia chegou para todas as áreas da saúde. A nutrição, por exemplo, estuda as características das crianças com neoplasias e trazem propostas de protocolos para recuperar o paciente que perde peso ou para ajudar a criança que está em corticoterapia e ganha muito peso. A reabilitação mudou muito, a fisioterapia, a fonoaudiologia, a terapia ocupacional e o próprio serviço social têm uma visão abrangente do paciente com câncer. Antigamente, para você ter uma ideia, nós contávamos com o auxílio de voluntários que pudessem ajudar financeiramente a trazer a criança para o atendimento. Outro problema na época era o preconceito que esses pacientes sofriam. O fato de cair cabelo era um impedimento até para eles pegarem o transporte público. Hoje não, você vê pessoas com cabelo, sem cabelo, pois eles têm direito ao ir e vir, e isso para mim é uma grande conquista!

“O livro “A Doença como Metáfora” diz que só com o surgimento de uma doença mais avassaladora para que se comece a desmistificar a anterior”

E quais são as perspectivas para a humanização pediátrica?
A palavra de ordem é ponderação. É preciso ponderar. Se você julga uma mãe que nunca chega no horário, você está julgando um fato, mas você não sabe que ela tem que acordar às 4 da manhã para pegar um ônibus, e se perder este ônibus somente consegue outro horas depois, o que gera o atraso. Daí você começa a entender esta família. Não significa ser paternalista, mas também não é ser inflexível, não é ser radical, principalmente em uma cidade como São Paulo e com uma população com dificuldades e limitações que a nossa tem. Entender melhor como é a dinâmica e o que pode ser otimizado são fatores primordiais para uma equipe atender seu paciente e sua família. Se eu sei que é tão difícil para a mãe levar a criança ao hospital às oito da manhã, eu devo tentar readequar o horário para ajudar no tratamento. Mesmo depois de anos de atuação nesta área, depois que eu me tornei mãe, mudei a visão que eu tinha da mãe e do pai do paciente. Eu me tornei uma profissional mais tolerante, paciente com a família. Antes eu defendia com unhas e dentes a criança, eu achava que a família tinha que fazer tudo aquilo que eu falava que era para fazer. E isso hoje mudou, eu escuto mais a mãe, eu enxergo as dificuldades que a maioria das famílias passa, muitas vezes com três, quatro filhos, dando à luz a outro enquanto o mais velho está em tratamento, por exemplo.

O conceito de cuidado paliativo sofreu redefinição pela OMS, em 2002. A senhora pode nos contar um pouco sobre isso? Como está a abordagem atual e quais são os seus princípios fundamentais?
A OMS mudou o conceito de cuidados paliativos e o reconceituou em pediatria englobando a família. Para a nossa área esta questão é vital, porque é a desconstrução do mito “cuidados paliativos é para o paciente que não tem mais nada a ser feito, é para o paciente que vai morrer”. E desconstruir este estigma é nossa responsabilidade. As pessoas, principalmente os profissionais da Enfermagem, precisam entender que o cuidado paliativo se inicia ao diagnóstico, isso em qualquer doença crônica, e segue também no decorrer de todas as fases do tratamento.
O conceito da OMS fala que cuidado paliativo é para um grupo de pacientes que possui uma doença que coloca a vida em risco. E é verdade, o cuidado paliativo é o cuidado não curativo; que compreende oferecer suporte, conforto e bem-estar para que o paciente e família passem por todo o período da doença, seja qual for este tempo, e que poderá terminar com a cura ou com a morte. Porque se esse paciente for curado ele precisa ser acompanhado das eventuais sequelas que o tratamento causou na vida dele do ponto de vista físico, emocional, espiritual. E se ele não foi curado e veio a falecer, a família continua sendo acompanhada durante a fase do luto, pois estamos falando de pacientes portadores de doenças crônicas. Essa família viveu meses, anos em função deste paciente e, de repente, ela perde esta tarefa, esta função de cuidador, podendo ficar desestruturada. Esta desestrutura que a doença crônica pode causar na família também é nossa função, enquanto profissionais da saúde, cuidar. Cuidado paliativo é cuidar sem o objetivo de curar. Antibioticoterapia, transfusão de hemocomponentes, medicação para a dor, antieméticos, reabilitação, tudo isso faz parte do tratamento paliativo, que é garantir o conforto com dignidade. No IOP temos um grupo de cuidados paliativos que cuida desses pacientes em tempo integral.
Comparo os cuidados paliativos de hoje com a morfina de antigamente. Na minha época, o uso da morfina estava associado a uma dor sem controle em um paciente que estaria morrendo. Nenhuma família queria ouvir que seu ente querido estava sendo tratado com morfina. Esta palavra era proibida. Hoje enfrentamos este paradigma nos cuidados paliativos para ser trabalhado. Precisamos que as equipes de saúde entendam que os princípios fundamentais deste cuidado envolvem apoiar o paciente para que ele viva de forma plena, administrando os sinais e sintomas do tratamento e da doença e integrando os aspectos psicológicos e espirituais ao tratamento.

E qual é o papel da enfermagem dentro do cuidado paliativo?
É fundamental, porque o tempo todo o enfermeiro acompanha o processo do tratamento. Independente de o paciente passar em consulta com o paliativista, o enfermeiro está o tempo todo próximo, estabelecendo um canal de comunicação, um vínculo. A demanda pelos cuidados médico e de enfermagem aumentam quando esses pacientes são considerados fora de possibilidade de cura, principalmente na terminalidade, onde o objetivo final é manter o conforto, o bem-estar e a dignidade, quando é prudente diminuir a ação curativa e focar na ação paliativa, pois esta não tem limites. O que se imaginar que poderá ter efeito benéfico estará dentro dos cuidados paliativos.

Como a senhora espera que seja o futuro da Enfermagem Oncológica?
Eu espero que consigamos oferecer formação técnico-científica e acadêmica, mas também humanizada e sensível aos nossos profissionais. Durante todos esses anos na Enfermagem Oncológica Pediátrica eu sinto que caminhamos para isto, pois é a nossa missão. Não podemos nos satisfazer em formar grupos em São Paulo, mas buscar ampliar o conhecimento em todos os pontos do Brasil. O que temos discutido também é o ensino in loco. Às vezes questionamos o fato de trazermos pessoas aqui e esta realidade ser muito diferente daquela vivida pelo profissional em seu local de atuação. Eu me lembro de que antes de ir para o Canadá estive em Recife para ministrar um curso compacto sobre oncologia pediátrica, e foi uma ótima experiência. Indo ao local de atuação dos profissionais, reconhecendo as dificuldades locais, as limitações e os pontos fortes, a transmissão do conhecimento é otimizado.

Dias C. Portal da Enfermagem – Enfermagem em Oncologia Pediátrica [internet] 2011 [citado 2011 Outubro 03]. Disponível em http://www.portaldaenfermagem.com.br .

13 de outubro de 2011

SAÚDE MENTAL

Dorisdaia Carvalho de Humerez
Enfermeira, avaliadora do Sinaes (BASis)/MEC, membro da Câmara Técnica de Pesquisa do Cofen
doris_daia@yahoo.com.br

14/9/2011

No momento em que o Brasil comemora dez anos de Reforma Psiquiátrica, o Portal da Enfermagem apresenta o universo da saúde mental e a atuação da enfermagem na visão da professora Dorisdaia Carvalho de Humerez, especialista em assistência psiquiátrica, cuja luta sempre foi no sentido de mudar a realidade da saúde mental no Brasil.

Embora seja um processo denso e de longo prazo, a política de saúde mental brasileira está em desenvolvimento e a principal sustentação da Reforma Psiquiátrica é o movimento de luta antimanicomial. Mas, embora haja avanços inegáveis aos direitos dos usuários da saúde mental no país, inclusive com a transformação no tratamento e na assistência, a Reforma Psiquiátrica enfrenta muitos desafios, que vão além de questões políticas, para sua consolidação efetiva.

Para Dorisdaia, a Reforma Psiquiátrica é projeto de horizonte democrático e participativo e exige mudança no trabalho dos profissionais da saúde. “Temos que produzir novas práticas para a construção de uma sociedade mais tolerante para com a diversidade”.

A entrevista pretende clarear o olhar da Enfermagem sobre a saúde mental, apresentando a atual visão da assistência, que trata a internação hospitalar como exceção e não como regra, apresentando o modelo humanizado por meio dos Centros de Atenção Psicossocial (CAPs), que hoje já somam mais de 1.600 em todos os estados, além do Programa Saúde da Família, das Casas de Acolhimento Transitório (CATs), dos Consultórios de Rua e das Comunidades Terapêuticas, cuja atuação da enfermagem é efetiva em todos esses serviços.

O que a levou seguir a carreira na área psiquiátrica?
Conclui a graduação na Escola de Enfermagem de Ribeirão Preto (EERP-USP) e iniciei a carreira profissional como docente em Enfermagem do Adulto na mesma instituição. Lá também ingressei no primeiro curso de pós-graduação stricto sensu na área de Enfermagem Psiquiátrica. Por motivos pessoais, mudei-me para São Paulo e ingressei na pós-graduação USP. Prestei concurso público na Universidade Federal de São Paulo (Unifesp) para docência em Enfermagem Psiquiátrica e lá fui docente por 23 anos, vivenciando cotidianamente a assistência psiquiátrica e lutando pela mudança de paradigmas na área. Conclui Mestrado em 1989, e já naquela época minha dissertação foi intitulada: ”Enfermagem e loucura: Visão do ser louco no cotidiano da instituição manicomial e os reflexos na prática de Enfermagem“. Minha carreira sempre foi voltada para esta área, tanto que ajudei a elaborar o curso de pós-graduação lato sensu em Enfermagem em Saúde Mental e Psiquiátrica da Unifesp, por onde já foram formados mais de 250 enfermeiros. Em 1996, ao concluir o Doutorado pela USP, elaborei minha tese centrada no tema “Em busca de lugares perdidos: Assistência ao doente mental revelada através de histórias de vida”. Fui supervisora de um número expressivo de enfermeiros que atuam na assistência pós-reforma psiquiátrica. Atualmente, tenho participado de grupos de pesquisas, bancas de mestrado e conferências no estado do Amazonas, pois lá a rede alternativa de saúde mental, pós-reforma, tem tido passos muito lentos. Minha atividade visa buscar estratégias para melhorar a assistência das pessoas com transtorno mental. Hoje, estou como representante do Conselho Federal de Enfermagem (Cofen) participando com a Procuradoria Federal dos Direitos do Cidadão da elaboração de uma cartilha de direitos às pessoas com transtorno mental.

A senhora poderia nos contar um pouco sobre o percurso da Reforma Psiquiátrica no Brasil?
A Reforma Psiquiátrica brasileira tem uma história própria, inscrita num contexto internacional de mudanças pela superação da violência asilar. O ano de 78 é identificado como o início efetivo do movimento social pelos direitos dos pacientes psiquiátricos no país. Foi o Movimento dos Trabalhadores de Saúde Mental, formado por trabalhadores de Saúde Mental, associações de familiares, sindicalistas, associações de profissionais e foi movimento social que passou a denunciar a violência dos manicômios, mercantilização da loucura e hegemonia da rede privada de assistência.
Começam a surgir às primeiras propostas para a reorientação da assistência e em 87 foi realizada a I Conferência Nacional de Saúde Mental, RJ e neste mesmo ano foi criado o 1º Centro de Assistência Psicossocial no Brasil em SP, como iniciativa de Luis Cerqueira. Em 89, houve o Processo de intervenção pela Secretaria Municipal de Santos (SP) na Casa de Saúde Anchieta. A experiência do município de Santos, que desenvolveu a construção de uma rede de serviços substitutivos ao manicômio, por suas características inovadoras, é reconhecidamente o marco no processo de Reforma Psiquiátrica Brasileira, pois se trata da primeira demonstração concreta de que a Reforma era possível e exequível.
No campo legislativo, em 89 é apresentado o Projeto de Lei do Deputado Federal Paulo Delgado que dispunha sobre a extinção progressiva dos manicômios e sua substituição por outros recursos assistenciais e regulamenta a internação psiquiátrica compulsória. Em 92, os movimentos sociais, inspirados pelo Projeto Lei Paulo Delgado, conseguem aprovar em vários estados brasileiros as 1ª leis e já se inicia a substituição progressiva dos leitos psiquiátricos por rede integrada de atenção à Saúde Mental.
A partir destes movimentos o Ministério da Saúde acompanha as diretrizes de construção da Reforma Psiquiátrica. O compromisso firmado pelo Brasil na Declaração de Caracas e II Conferência Nacional de Saúde Mental passam a entrar em vigor e as 1ª normas federais regulamentando a implantação de serviços alternativos, como os Centros de Atenção Psicossocial (CAPs) e as 1ª normas para fiscalização e classificação dos hospitais psiquiátricos.
Após 12 anos de tramitação no Congresso Nacional, a Lei n. 10.216 foi finalmente sancionada pelo Presidente da República em 6 de abril de 2001, lei esta que dispõe sobre a proteção e os direitos das pessoas portadoras de transtornos mentais. A lei em questão proíbe, em todo o Brasil, a construção de novos hospitais psiquiátricos e a contratação pelo serviço público de leitos e unidades particulares deste tipo; estabelece que os tratamentos devam ser realizados, preferencialmente, em serviços comunitários de saúde mental e, como finalidade primordial, procura a reinserção social do doente mental em seu meio. A internação só será indicada quando os recursos extra-hospitalares se mostrarem insuficientes. No contexto da promulgação da lei e da realização da III Conferência Nacional de Saúde Mental, no mesmo ano, a política de Saúde Mental, alinha-se com as diretrizes da Reforma Psiquiátrica. A Reforma passa a consolidar-se e vai tendo sustentação e visibilidade.

Quais são os seus avanços?
Considero um grande avanço, o declínio contínuo do número de leitos em hospitais psiquiátricos e simultaneamente à diminuição do número de leitos hospitalares, que tem ocorrido paralelo à ampliação dos CAPs e de outros serviços alternativos de assistência. Temos o programa De Volta Para Casa, que constitui um conjunto de medidas integradas de atendimento, tratamento e amparo aos pacientes com transtorno mental que são ações determinadas pelo Ministério da Saúde. O programa consiste em um auxílio financeiro para pacientes que receberam alta hospitalar, após histórico de longa permanência em internação psiquiátrica. Este programa prepara a pessoa para seu retorno a vida social e lhe garante o resgate à cidadania, visto que possibilita, inclusive, que ele seja um consumidor.
Ainda a rede de atenção integrada em saúde mental conta com assistência das equipes de Estratégia de saúde da família, das Casas de Acolhimento Transitório, de Consultórios de Rua, entre outros, o que pouco a pouco vai fazendo com que um maior número de pessoas com transtorno mental não sejam penalizadas e fiquem presas, por longos períodos.

E os principais desafios?
Algumas considerações devem ser feitas a respeito de dois desafios cruciais da Reforma, que são também os desafios do SUS. Sem a potencialização da rede básica ou atenção primária de saúde, para a abordagem das situações de saúde mental, não é possível desenhar respostas efetivas para o desafio da acessibilidade.
Estima-se que 3% da população necessitam cuidados contínuos em saúde mental, em função de transtornos severos e persistentes (psicoses, neuroses graves, transtornos de humor graves, deficiência mental com grave dificuldade de adaptação). A magnitude do problema (no Brasil, cerca de 5 milhões de pessoas) exige uma rede de cuidados densa, diversificada e efetiva. Ainda temos transtornos graves associados ao consumo de álcool e outras drogas (exceto tabaco) que atingem 12% da população acima de 12 anos, sendo o impacto do álcool dez vezes maior que o do conjunto das drogas ilícitas.
A qualidade do atendimento deve ser garantida em todas as regiões do país, mesmo as mais carentes e distantes dos centros universitários, e pode ser assegurada através de um forte programa de capacitação, supervisão e formação de multiplicadores. O distanciamento entre as instituições de formação e pesquisa e a saúde pública, no Brasil, agrava as carências de formação e qualificação de profissionais.
Outro grande desafio para o processo de consolidação da Reforma Psiquiátrica Brasileira é a formação de recursos humanos, pois devem ser capazes de superar o paradigma da tutela do louco e da loucura. O processo da Reforma psiquiátrica exige cada vez mais, formação técnica e teórica dos trabalhadores, muitas vezes desmotivados por baixas remunerações ou contratos precários de trabalho. Ainda, várias localidades do país têm muitas dificuldades para o recrutamento de determinadas categorias profissionais, geralmente formadas e residentes nos grandes centros urbanos.
No entanto, o principal desafio da Reforma Psiquiátrica é a inclusão social e promoção da cidadania das pessoas com transtornos mentais. A potencialização do trabalho como instrumento de inclusão social dos usuários dos serviços. Já existe a criação de cooperativas e associações que garantam a geração de renda aos usuários e estas experiências, com bons resultados, ainda, são de frágil sustentação institucional e financeira, visto a realidade de um mercado capitalista e uma sociedade excludente. Mas vem substituindo aos poucos o componente da antiga reabilitação pelo trabalho, dado no marco asilar.

“A qualidade do atendimento pode ser assegurada
através de um forte programa de capacitação,
supervisão e formação de multiplicadores”


Com a implantação da lei 10216/01, quais foram as mudanças nas ações dos profissionais que atuam na área de saúde mental?
Naturalmente, os profissionais que atuavam nos hospitais asilares, posteriormente à lei 1021/2001, passaram a atuar nos vários dispositivos alternativos de assistência. Obrigatoriamente tinham que livrar-se da ideia de ações de tutela e exclusão, ou não se adaptariam ao processo. Hoje temos um considerável número de estudos, dissertações, teses, rede de saúde mental online que mostra que os trabalhadores da saúde mental buscam incessantemente em suas ações cotidianas, não apenas como profissionais, mas como cidadãos em busca do resgate da cidadania das pessoas que foram diagnosticadas como portadoras de transtorno mental.

Com o processo da Reforma Psiquiátrica e as políticas de desinstitucionalização houve aumento da demanda nos serviços de Emergência de hospitais gerais. Isso é fato? Como driblar esta problemática?
Esta é uma parte da história da Reforma Psiquiátrica no Brasil, pois prevê que a pessoa com transtorno mental seja atendida como qualquer outro cidadão e, portanto, os serviços de emergência passaram a recebê-las. Uma rede pública de saúde na qual a pessoa em sofrimento psíquico possa ser atendido em um espaço comum e/ou integrado ao atendimento clínico geral se faz cada vez mais necessária, pois a pessoa com transtorno mental deve ser vista com um usuário do sistema geral de atenção à saúde e, assim corpo e mente não podem ser tratados em espaços separados, contribuindo para a estigmatização da doença mental e a reafirmação dessa falsa dicotomia. Está previsto que o atendimento às urgências psiquiátricas e o atravessamento da crise, em suas várias facetas deve acontecer, sem o afastamento da família.

E como podemos definir Emergência Psiquiátrica?
Qualquer situação de natureza psiquiátrica em que existe um risco significativo, de vida ou injúria grave, seja para a pessoa ou para outros. As emergências psiquiátricas ocorrem quando existe uma perturbação do funcionamento do sistema nervoso central ou mesmo na iminência desta, como por exemplo, na intoxicação por drogas, no surto esquizofrênico, na encefalite; quando o paciente sofre uma experiência vital traumática, por exemplo, morte de um parente, violência sexual, assaltos; ou como consequência de uma agressão física que gera um distúrbio psíquico (traumatismos cranianos, distúrbios endocrinológicos, distúrbios hidroeletrolíticos). Qualquer pessoa pode apresentar, ao longo da vida, uma condição mental que caracterize uma emergência psiquiátrica digna de tratamento imediato. Nos hospitais, algumas condições parecem ser mais comuns para atendimento, como risco e tentativas de suicídio; intoxicação e abstinência por álcool e drogas; doenças físicas e alterações psíquicas, como ansiedade, transtorno somatoforme, transtorno dissociativo, entre outros. No entanto é sabido que o principal diagnóstico realizado no serviço de emergência psiquiátrica é alcoolismo.

Esta Reforma teve início em razão da luta antimanicomial. Manicômios continuam sendo uma realidade brasileira em algum ponto do país?
Ainda existem, mas em desativação, pois o Ministério da Saúde estabelece diretrizes e normas para a assistência hospitalar em psiquiatria, reclassifica os hospitais psiquiátricos, define e estrutura, a porta de entrada para as internações psiquiátricas na rede do SUS, bem como redefine a forma de subsídio para os serviços hospitalares e extra-hospitalares, desestimulando os hospitalares.

Como eles sobrevivem? O SUS os mantém mesmo com a Reforma?
Sobrevivem, mas com dificuldades crescentes, pois nos últimos anos, o processo de desinstitucionalização de pessoas com longo histórico de internação psiquiátrica avançou significativamente, sobretudo através da instituição pelo Ministério da Saúde de mecanismos seguros para a redução de leitos no país e a expansão de serviços substitutivos ao hospital psiquiátrico. O Programa Anual de Reestruturação da Assistência Hospitalar Psiquiátrica no SUS (PRH) e a expansão de serviços como os Centros de Atenção Psicossocial (CAPs) e as Residências Terapêuticas, vem permitindo a redução de milhares de leitos psiquiátricos no país e o fechamento de vários hospitais psiquiátricos. Embora em ritmos diferenciados, a redução do número de leitos psiquiátricos vem se efetivando em todos os estados brasileiros Entre os instrumentos de gestão que permitem as reduções e fechamentos de leitos de hospitais psiquiátricos de forma gradual, pactuada e planejada, está o Programa Nacional de Avaliação do Sistema Hospitalar/Psiquiatria. Essencialmente um instrumento de avaliação, o PNASH/Psiquiatria permite aos gestores um diagnóstico da qualidade da assistência dos hospitais psiquiátricos conveniados e públicos existentes em sua rede de saúde, ao mesmo tempo em que indica aos prestadores critérios para uma assistência psiquiátrica hospitalar compatível com as normas do SUS, e descredencia aqueles hospitais sem qualquer qualidade na assistência prestada a sua população adstrita. Linhas específicas de financiamento são criadas pelo Ministério da Saúde para os serviços abertos e substitutivos ao hospital psiquiátrico e novos mecanismos são criados para a fiscalização, gestão e redução programada de leitos psiquiátricos no país. A partir deste ponto, a rede de atenção diária à saúde mental experimenta uma importante expansão, passando a alcançar regiões de grande tradição hospitalar, onde a assistência comunitária em saúde mental era praticamente inexistente.

Por que não deu certo extinguir os manicômios brasileiros?
Não deu certo? A desconstrução manicomial é a desconstrução dos velhos saberes para reconstrução de novas práticas de assistência. Extinguir os manicômios representa que temos que viver em sociedade sem manicômios, mais tolerante, e especialmente, livre dos manicômios mentais, dos nossos desejos de manter ações excludentes. No que tange a extinção dos manicômios temos que a desospitalização é uma realidade e acontece de forma programada como resultado dos mecanismos de avaliação dos hospitais psiquiátricos e do Programa Anual de Reestruturação da Assistência Psiquiátrica (PRH). Temos ainda, cerca de 30 a 40% dos leitos psiquiátricos, mas estes estão em hospitais de pequeno porte, com até 160 leitos, com tendência a extinção. Excluir as pessoas com transtornos mentais e largá-las presas por 20, 30 anos é muito antigo e essa idéia de manicômio tem sido, felizmente desfeita. No Brasil, as grandes revoluções e golpes autoritários brasileiros foram seguidos por encarceramentos em massa de loucos, e junto com eles iam os inimigos políticos, os desafetos, os pobres, os negros.

O que engloba um tratamento mais humanizado a pacientes com transtornos mentais?
As pessoas têm valores que são fundamentais e a base da reforma psiquiátrica é a escuta do sofrimento. Quem não gostar de ouvir a pessoa com transtorno mental não tem condições de trabalhar na área. O transtorno mental é, talvez, das áreas da saúde que mais exige solidariedade, desprendimento, destemor, capacidade de absorção, de produção e de sentimentos de cooperação e de integração social. As pessoas com transtornos mentais necessitam de programas de integração social. Essa é a ideia essencial da reforma psiquiátrica: construir um centro de gravidade baseado no paciente, e aí a reforma se faz pela transferência de recursos da área.

A inclusão social da pessoa com transtorno mental é outro desafio da Reforma Psiquiátrica. Esta tarefa também é dos profissionais de saúde?
Sim, mas também de toda a sociedade. Os profissionais têm a competência de assistir a pessoa portadora de doença mental como um cidadão de direitos e de deveres, que deve ser atendida na sua singularidade. Temos que desfazer a lógica voltada para o silenciamento da loucura e manutenção da ordem e disciplina. Temos que enfrentar a existência de uma dicotomia entre o saber e o fazer na saúde.

Quais são as recomendações para o cuidado em enfermagem diante da atual política de saúde mental?
A assistência à saúde mental é multiprofissional e transversal na saúde. O cuidado de Enfermagem em saúde mental não está baseado em uma terapêutica mais adequada, pois o adequado aqui é o adequado a cada um dos sujeitos. A ideia é primeiro restabelecer o mais plenamente possível a singularidade dos acontecimentos que eles podem produzir ou vir a se sujeitar; uma dimensão da vida humana que é desconhecida, quase intratável num primeiro momento. Nessa dimensão, a Enfermagem deve particularizar os fenômenos, pois na assistência a ciência entra como ferramenta e não como fim, porque tende a mostrar o universal e, assim, destitui o sujeito, ou a sua singularidade.

Qual a relação da saúde mental com o campo da saúde coletiva?
A saúde mental na atenção primária é a articulação com o programa de saúde da família. O desenvolvimento da estratégia Saúde da Família nos últimos anos marca um progresso indiscutível da política do SUS. Atendendo ao compromisso da integralidade da atenção à saúde, vem investindo na promoção da saúde. Estruturado em equipes de Atenção Básica, a cobertura da Estratégia Saúde da Família já alcança todo o país. O campo de intervenção de cada Equipe de Atenção Básica é sempre composto pelas pessoas, famílias e suas relações com a comunidade e com o meio ambiente. A realidade destas equipes de Atenção Básica vem demonstrando que, cotidianamente, elas se deparam com problemas de saúde mental. Cada equipe do PSF (médico, enfermeiro, auxiliar de enfermagem, agente comunitário de saúde) está encarregada da cobertura de até 1.000 famílias, ou cerca de 3.400 pessoas de um município ou bairro. Assim, por sua proximidade com famílias e comunidades, as equipes da Atenção Básica se apresentam como um recurso estratégico para o enfrentamento de importantes problemas de saúde pública, como os agravos vinculados ao uso abusivo de álcool, drogas e diversas outras formas de sofrimento psíquico. Existe um componente de sofrimento subjetivo associado a toda e qualquer doença, às vezes atuando como entrave à adesão a práticas preventivas ou de vida mais saudáveis. Poderíamos dizer que todo problema de saúde é também, de saúde mental, e que toda saúde mental é produção de saúde. Nesse sentido, será sempre importante e necessária a articulação da saúde mental com a Atenção Básica. A articulação entre as políticas de saúde mental e de atenção primária à saúde visa ampliar e tornar mais eficazes as intervenções dos dois campos. Neste momento, os indicadores de saúde mental já compõem o rol de indicadores das equipes de atenção básica e inicia-se o esforço fundamental de garantir o acesso da população, em especial nos pequenos municípios brasileiros, à atenção em saúde mental.

A senhora concorda que o estigma e a discriminação são importantes obstáculos para a busca de assistência?
O estigma é potencialmente mais debilitante para a saúde do que a própria doença, conduzindo a um nível de autoestima baixo e ao isolamento social. A figura do louco, para quem não mantém contato com a loucura, desperta inúmeras fantasias. É frequente, no senso comum, relacionar a loucura à periculosidade, à agressividade, à violência. São crenças infundadas, contudo difundidas que cria o estigma e o preconceito. Isolar a pessoa em relação aos outros e estigmatizá-lo, foi durante muito tempo a prática social na assistência à saúde mental. Enfrentar o estigma e o preconceito no sentido de incluir a pessoa com transtorno mental ao convívio social é um dos desafios impostos pela Reforma psiquiátrica e deve ser tarefa dos profissionais de saúde, dos usuários, dos familiares, de toda sociedade. Temos que considerar que preconceito de qualquer monta é fruto da ignorância e de uma consciência social moralmente negativa. O preconceito é um fenômeno simbólico, usualmente composto por pensamentos, sentimentos, fantasias ou crenças, a partir do qual se sustentam as práticas de exclusão social.

E como combater?
Primeiro devemos desmistificar algumas questões a respeito dos problemas psicológicos e das doenças mentais. O profissional deve trabalhar com afinco para driblar o preconceito e contribuir com a manutenção e reinserção do paciente na sociedade e encontrar estratégias, no jogo das práticas sociais, que possibilitem o resgate da identidade do paciente, que deve compartilhar com ele para resgatar o relacional e favorecer a sua participação na vida com os outros e conceder-lhe autonomia nas decisões sobre sua própria vida. Deve buscar um modo de intervenção compartilhado com os usuários, em busca de táticas e estratégias para reinventar, com eles, um lugar identitário, relacional e histórico, onde o sofrimento não pode ser negado, mas deve ser acolhido, compreendido, não necessariamente explicado, mas compartilhado, para não ter como solução, unicamente o controle de suas ações. Deve buscar criar uma dinâmica de trabalho que tenha flexibilidade e disponibilidade para as transformações e, especialmente, para se confrontar com a insistência dos retrocessos e do retorno dos preconceitos. Não basta tirá-los dos espaços tradicionalmente manicomiais, se a qualidade da relação nos outros espaços, mesmo que comunitários não se configurar como igualitária. É uma luta árdua, pois enfrenta interesses lucrativos e mudanças culturais a cerca da tolerância frente às diferenças do ser humano.

“o sofrimento não pode ser negado, mas deve ser
acolhido, compreendido, não necessariamente
explicado, mas compartilhado”


Uma das propostas da Reforma Psiquiátrica é a redução dos leitos psiquiátricos, tornando a assistência cada vez menos hospitalocêntrica. Como fortalecer o atendimento extra-hospitalar?
As portarias ministeriais deixam clara a necessidade de um espaço continente à doença e a pessoa com sofrimento psíquico, contando com esforço conjunto das três esferas de governo, bem como de uma equipe multiprofissional, considerando o cuidado intra, inter e transubjetivo, articulando recursos de natureza clínica, incluindo medicamentos essenciais, de moradia, de trabalho, de lazer, de previdência e outros, priorizando um cuidado clínico oportuno e programas de reabilitação psicossocial. A redução do número de leitos deve ser proporcional à criação de atendimento extra-hospitalar. Os CAPs são serviços de saúde mental de base territorial e comunitária do SUS, referenciais no tratamento das pessoas que sofrem com transtornos mentais, cuja severidade e/ou persistência justifiquem sua permanência em um dispositivo de cuidado intensivo, comunitário, personalizado e promotor de vida. O objetivo dos CAPs é oferecer atendimento à população de sua área de abrangência, realizando o acompanhamento clínico e a reinserção social dos usuários, pelo acesso ao trabalho, lazer, exercício dos direitos civis e fortalecimento dos laços familiares e comunitários. É um serviço de atendimento de saúde mental criado para ser substitutivo às internações em hospitais psiquiátricos, equipamento estratégico da atenção extra-hospitalar em saúde mental. Hoje os gastos federais com ações extra-hospitalares ultrapassaram o investimento nas ações hospitalares.

Atualmente, quais são as opções de terapêuticas em substituição ao modelo hospitalocêntrico?
Hoje o sistema manicomial começa a fazer parte da história. A principal opção, no caso da Reforma Psiquiátrica brasileira são os CAPs Existem diferentes tipos de CAPs, segundo seu porte e clientela: CAPs I é serviço aberto para atendimento diário de adultos com transtornos mentais severos e persistentes: trata-se de equipamento importante para municípios com população entre 20 mil e 70 mil habitantes; CAPs II é o serviço aberto para atendimento diário de adultos com transtornos mentais severos e persistentes: trata-se de equipamento importante para municípios com população com mais de 70 mil habitantes; e o CAPs III é aberto para atendimento diário e noturno, durante sete dias da semana, de adultos com transtornos mentais severos e persistentes: trata-se de equipamento importante em grandes cidades. Ainda, o CAP I está voltado para a infância e adolescência, para atendimento diário a crianças e adolescentes com transtornos mentais e o CAPs AD está voltado para usuários de álcool e outras drogas, para atendimento diário à população com transtornos decorrentes do uso destas substâncias. Os CAPs assumem, portanto, especial relevância no cenário das novas práticas em saúde mental no país, configurando-se como dispositivo tornado estratégico para a reversão do modelo hospitalar. O Ministério da Saúde preconiza para estes serviços o papel de articulador de uma lógica de rede calcada em várias instâncias, como as de cuidados básicos (Programa Saúde da Família - PSF), ambulatórios, leitos de hospitais gerais e iniciativas de suporte e reabilitação psicossocial, Serviços Residenciais Terapêuticos e trabalho protegido. No entanto, a função aglutinadora e organizadora da rede local de saúde mental requerida dos CAPs é ainda um horizonte a ser alcançado no plano nacional.

Os CAPs podem vir a garantir a equidade e a promoção da autonomia e dos direitos no campo da saúde mental?
A política pública de saúde, materializada no SUS, é, por definição, intersetorial, para atingir os resultados desejados e definidos nas diretrizes gerais do SUS: integralidade, universalidade, equidade, controle social. No princípio da equidade todos devem ter igualdade de oportunidade em usar o sistema de saúde; como, no entanto, o Brasil contém disparidades sociais e regionais, as necessidades de saúde variam. A função primeira dos CAPs é promover a inserção social das pessoas com transtornos mentais através de ações intersetoriais, regular a porta de entrada da rede de assistência em saúde mental na sua área de atuação e dar suporte à atenção à saúde mental na rede básica. É função, portanto, e por excelência, dos CAPs organizar a rede de atenção às pessoas com transtornos mentais nos municípios atendendo aos princípios do SUS. Os CAPs são os articuladores estratégicos desta rede e da política de saúde mental num determinado território e, portanto, a equidade é a meta.

Qual a sua opinião sobre as Comunidades Terapêuticas?
As Comunidades Terapêuticas (CTs) são locais dentro de um espaço físico apropriado, é montada uma microsociedade, contendo todos os elementos de uma grande comunidade ou sociedade. As CT têm uma série de normas que norteiam o comportamento dos seus membros. Como um dos principais fatores de uma sociedade é o trabalho, dentro da CT geralmente haverá o trabalho.
Existem inúmeras Comunidades Terapêuticas no Brasil, que agora devem obedecer a critérios mínimos para funcionar, de acordo com a Resolução RDC no. 101, de 30 de maio de 2001. As casas abertas a partir da resolução podem atender no máximo 60 pessoas, divididas em dois pavimentos. As Comunidades Terapêuticas passam a ser um ambiente para a recuperação psicossocial por meio do convívio do dependente com outras pessoas que têm o mesmo problema. As CTs, desde que atendam a Resolução, poderão ser equipamentos importantes para a reforma psiquiátrica, no entanto, ainda encontramos inúmeras que necessitam ser reorganizadas.

A senhora poderia nos pontuar um país modelo de atendimento em saúde mental, referência em psiquiatria?
A Itália foi o país que inspirou a Reforma psiquiátrica brasileira, no entanto a nossa reforma tomou um rumo próprio e podemos já ser referência para outros países.

No âmbito da saúde privada, no que se refere aos convênios e operadoras de saúde, há ainda muita dificuldade de atendimento aos portadores de transtornos mentais. Qual a situação atual e a sua opinião sobre o assunto?
De certa forma, pela questão histórica da privatização da saúde mental, foi necessário desativar, progressivamente, os contratos com as empresas privadas, privilegiando-se os convênios com as universidades e outras instituições públicas, utilizando-se basicamente a rede pública. No entanto, a regulamentação da lei dos planos de saúde, a 9656/98, tem permitido que os hospitais privados atendam portadores de transtornos mentais que possuem planos ou seguro de saúde. Ainda que questione muitos aspectos da lei, como a limitação do período de internação, dirigentes de instituições privadas destacam que vale a pena o investimento na melhoria da rede física hospitalar visando ao recebimento dos pacientes. Até a regulamentação da lei, as pessoas com transtornos mentais só eram atendidos como pacientes particulares ou via SUS. As instituições privadas, na assistência a saúde mental devem estar sempre sob supervisão e existe Portaria que cria um subsistema de supervisão, controle e avaliação da assistência em saúde mental, pelos diversos níveis do SUS, de modo a garantir um bom padrão e qualidade, seja nos hospitais públicos ou privados.

Diante da realidade, o que devemos esperar da Enfermagem que atua na área de Saúde Mental?
Os alunos da graduação em enfermagem psiquiátrica experienciam, geralmente, um atendimento à saúde mental fundamentado numa nova concepção sobre a loucura, em propostas de tratamento que visam o resgate da cidadania; podem verificar a participação efetiva do enfermeiro na assistência e as possibilidades de aplicação do conhecimento ainda enquanto estudantes, contribuindo na atenção à saúde mental, bem como, na desmistificação da loucura. Dos profissionais da Enfermagem temos que esperar que levem em conta, especialmente, o processo de integração da pessoa com transtorno mental, que o eleve à cidadania.

O que envolve/ engloba o diagnóstico de enfermagem a pacientes com transtornos mentais?
Destaca-se a relevância da sistematização da assistência de enfermagem psiquiátrica, visto que o modelo que inclui os padrões de respostas humanas enfoca em sua essência a totalidade sadia do doente mental, deixando de lado o paradigma obsoleto de planejar as ações de enfermagem psiquiátrica tendo como pano de fundo o transtorno mental, representando um viés às tentativas de reabilitação psicossocial desenvolvidas até hoje. A sistematização da assistência em enfermagem psiquiátrica funciona como uma ferramenta útil e importante na tentativa de construir uma práxis mais eficaz na enfermagem psiquiátrica brasileira, no que se refere à reabilitação psicossocial. É constatada a viabilidade de participação concreta do enfermeiro psiquiátrico na busca de tecnologias que gerem resultados positivos e inovadores em sua prática cotidiana, não deixando de lado a essência de sua profissão, que é o cuidado ao doente mental.
Identificar os comprometimentos de origem emocional emergente ou decorrentes de internação e do adoecer é fundamental para, juntamente com o exame físico, subsidiar e otimizar a assistência integral de cada pessoa com transtorno mental.
Com a análise da entrevista com a pessoa e com a família e da taxonomia da NANDA, chegamos geralmente aos mais frequentes diagnósticos de enfermagem: Ansiedade; Déficit no autocuidado para banho/ higiene; Déficit no autocuidado para vestir-se/ arrumar-se; Baixa autoestima situacional; Comportamento de saúde propenso a risco; Confusão aguda; Angústia espiritual; Isolamento social; Risco de solidão; Risco de suicídio; Síndrome pós-trauma; Risco de violência direcionada a outros e Risco de violência direcionada a si mesmo. O diagnóstico de enfermagem proporciona base para uma melhor resposta ao tratamento e consequentemente a um bom prognóstico, sendo um instrumento próprio do enfermeiro, devendo ser utilizado amplamente em transtornos psiquiátricos.

Que tipo de assistência este profissional deve receber?
Qualquer profissional de saúde necessita assistência, visto que trabalha com o sofrimento humano. Os profissionais de UTI que lidam diretamente com o processo de morte e outros e, na saúde mental, os profissionais lidam com o sofrimento psíquico e necessitem também de assistência. No entanto, o fato de atuar na saúde mental, não exige cuidados especiais dos trabalhadores.

Qual o seu direcionamento aos profissionais da Enfermagem que querem se especializar em Saúde Mental?
Há a necessidade imperiosa de capacitação e formação, de forma orientada aos profissionais de saúde, em uma perspectiva multiprofissional. Devem ser planejadas ações de capacitação voltadas para os trabalhadores de saúde componentes de equipes atuantes em unidades especializadas, tipo CAPs ad, uma vez que, estrategicamente, tais unidades também possuem a atribuição de multiplicar conhecimentos para equipes atuantes na atenção básica. Todo profissional de Enfermagem que desejar atuar na área da saúde mental necessita ampliar seus estudos, visto que os cursos de graduação não valorizam a saúde mental e geralmente as cargas horárias são das mais diminutas. É uma área de alta especialidade e existem inúmeros cursos de pós-graduação, tanto multiprofissional em saúde mental, quanto em Enfermagem em Saúde Mental ou Psiquiátrica.

A senhora ratifica que “reforma psiquiátrica é projeto de horizonte”. Qual a dimensão deste conceito?
O processo de Reforma Psiquiátrica é um projeto de horizonte democrático e participativo. A reforma psiquiátrica é uma transição. O velho não predomina e o novo ainda não domina. Nessa luta entre o domínio e predomínio, que é o conceito clássico de transição para afirmar o que deve predominar, temos que levar em conta algumas questões. A primeira delas é que a reforma tem que ter um sentido mais diretivo do que imperativo. A reforma tem que conquistar pessoas.
O processo da Reforma Psiquiátrica, e mesmo o processo de consolidação do SUS, somente é exequível a partir da participação ativa de trabalhadores, usuários e familiares na construção dos modos de tratar e nos fóruns de negociação e deliberação do SUS (conselhos gestores de unidades, conselhos municipais, estaduais e nacional de saúde, conferências). Trata-se, afinal, do desafio de ir construindo uma política pública e coletiva para a saúde mental.
A Reforma Psiquiátrica no Brasil vem configurando-se como um movimento com diferentes graus de adesão e entendimento por parte dos profissionais e de alguns segmentos da sociedade. Tratada como desospitalização, sem as condições necessárias para viabilizar uma proposta de ressocialização/reabilitação, reflete de forma negativa sobre a família, pois é nesta que se dá o embate com a realidade cotidiana do cuidado ao doente mental. Apesar dos obstáculos mencionados, percebemos que no contexto do CAPs há uma tendência de crescimento da Reforma Psiquiátrica, em sentido mais amplo, e do trabalho interdisciplinar, em sentido mais estrito.

Em uma de suas palestras, a senhora apresentou dados estatísticos muito interessantes. Poderia, por favor, nos informar se esses números permanecem atuais?
Os Transtornos Mentais não são um domínio exclusivo deste ou daquele grupo especial de pessoas; eles são verdadeiramente universais. Observam-se Transtornos Mentais e Comportamentais em pessoas de todas as regiões, todos os países e todas as sociedades. Os Transtornos Mentais estão presentes em mulheres e homens em todos os estágios da vida. Eles estão presentes entre ricos e pobres e entre pessoas que vivem em áreas urbanas e rurais. É muito errônea a ideia de que os Distúrbios Mentais são problemas das áreas industrializadas e relativamente mais ricas. Igualmente é incorreta a crença de que as comunidades rurais, relativamente não afetadas pelo ritmo rápido da vida moderna, não sofrem distúrbios mentais.
Análises efetuadas recentemente pela OMS (Organização Mundial da Saúde) mostram que as condições neuropsiquiátricas que abrangiam certo número desses Distúrbios Mentais acusaram uma prevalência em cerca de 10% dos adultos. Estimou se em 450 milhões o número de pessoas, no mundo todo, que sofriam afecções neuropsiquiátricas. Tais afecções compreendiam os Transtornos Depressivos Unipolares, Transtornos Afetivos Bipolares, Esquizofrenia, Epilepsia, Transtornos Devidos ao Uso de Álcool e Drogas, Alzheimer e outras demências, Síndrome de Estresse Pós-Traumático, Transtorno Obsessivo-Compulsivo, Transtornos de Pânico e Insônia Primaria.
Estudos epidemiológicos mostram que milhões de pessoas sofrem algum tipo de doença mental no mundo e que este número vem sofrendo um aumento progressivo, principalmente nos países em desenvolvimento.
Casos com sintomas ansiosos, depressivos ou somatoformes, mesmo não satisfazendo todos os critérios diagnósticos de doença mental, apresentam uma elevada prevalência na população adulta. Entretanto, apenas uma pequena parte deles é identificada e tratada, aumentando o sofrimento individual e com implicações socioeconômicas significativas, pois tais sintomas constituem causa importante de dias perdidos de trabalho, além de elevarem a demanda nos serviços de saúde.
Temos como dados da OMS que os transtornos mentais são 4ª causa de incapacitação em todo o mundo sendo que 34% das consultas médicas no Brasil evidenciam queixas de algum sofrimento psíquico.
Da população adulta, 30% já apresentaram algum transtorno mental, 3% da população brasileira sofrem de transtorno mental severo e persistente, ou seja, cerca de 3,6 milhões de pessoas, sendo 2,4 milhões – esquizofrenia. Um milhão de pessoas comete suicídio/ano e 10 a 20 milhões tentam o suicídio/ano e 6% da população apresentam transtorno psiquiátrico grave decorrente do uso abusivo de álcool e outras drogas. Ainda, 12% da população sofrem de transtorno moderado e requerem ações de Saúde Mental especializada.

Quais referências bibliográficas a senhora sugere?
Como sugestão de bibliografia, recomendo:
http://bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/Relatorio15_anos_Caracas.pdf
http://bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/07_0416_M.pdf
http://www.ccs.saude.gov.br/memoria%20da%20loucura/mostra/reforma.html

Humerez D. M. Portal da Enfermagem – Saúde Mental [internet] 2011 [citado 2011 Setembro 14]. Disponível em http://www.portaldaenfermagem.com.br .

9 de outubro de 2011

RECRUTAMENTO E SELEÇÃO

Maria de Lourdes Neves
Psicóloga, especialista em Psicologia Social e Psicologia Organizacional
marilunef@yahoo.com.br

31/8/2011

Toda e qualquer empresa precisa recrutar e selecionar. Nos dias de hoje, este processo está ainda mais complexo e vai além de avaliar currículos e promover entrevistas. A tarefa de buscar no mercado de trabalho um profissional que atenda ao perfil e às necessidades do cargo a ser ocupado exige do recrutador, além de competência técnica, habilidade, bom senso e dinamismo.

Nesta entrevista concedida ao Portal da Enfermagem, Maria de Lourdes Neves Fonseca Azevedo da Costa, especialista em Psicologia Social das Organizações e Psicologia Organizacional e do Trabalho, explica a diferença entre recrutar e selecionar e o que abrange cada tarefa. Ela ainda ressalta que as instituições são cobradas por melhores resultados, por atendimento e prestação de serviço com maior qualidade e que recrutar e selecionar faz parte do objetivo a ser alcançado.

Mestre em Bioética, Maria de Lourdes atua há 28 anos na área de Gestão de Pessoas no segmento da Saúde e, atualmente, é Gerente de Gestão de Pessoas do Conselho Regional de Enfermagem (Coren-SP).


Como podemos definir Recrutamento e Seleção de Pessoal?
Embora possa receber outros nomes como captação de talentos, gerenciamento de pessoal, e o que mais a nomenclatura mais moderna exigir, se você quiser contratar alguém para trabalhar em sua empresa, vai precisar recrutar e selecionar.
É interessante porque sempre falamos recrutamento e seleção como se fosse um nome composto. Na verdade não o é. E por sinal são situações bem distintas dentro do processo. Recrutar significa identificar - no universo de possibilidades que você tem - as pessoas que possuem os requisitos básicos para ocupar a vaga em aberto. Selecionar é definir entre os candidatos recrutados aquele ou aqueles mais adequados aos cargos existentes, visando manter ou aumentar a eficiência da organização e conduzi-la à excelência e ao sucesso.


Como é operacionalizado e quais os principais meios de recrutamento de pessoal?
O que inicia um processo de contratação é o recebimento de uma solicitação de pessoal encaminhada pela área requisitante à Gestão de Pessoas. A partir daí, a área de Gestão de Pessoas deve ter muito claro todos os requisitos do cargo - competências exigidas - para que possa, com clareza, iniciar o processo.
Caso a empresa tenha como política a valorização e retenção de seus talentos, primeiramente verificará dentro da própria empresa os colaboradores que se encaixam no perfil requerido – esta ação é denominada de recrutamento interno.
Uma vez identificadas as pessoas, o próximo passo é a seleção. Vale ressaltar que caso tenha um colaborador com as competências comportamentais para o cargo, porém necessite de uma capacitação técnica, posso instrumentalizá-lo e prepará-lo para o cargo e depois efetuar a promoção. Esta opção dependerá da política da empresa e do tempo que o departamento disponibiliza para a vaga ser ocupada.
Caso perceba que dentro da empresa não existe o profissional com os requisitos, deve-se optar por recrutamento externo.
Optando-se por recrutamento externo lançamos mão de anúncios em jornais, sites especializados, quadro de aviso interno, site da empresa, consultorias, networking entre empresas e redes sociais como Orkut, Facebook e Twitter, dentre outros. Lembramos que uma prática comum é o incentivo de indicação de amigos de colaboradores para trabalhar na instituição. Algumas empresas têm como prática oferecer bônus para colaboradores que indicarem pessoas e estas passarem na experiência, outras efetuam sorteio de viagens e outros brindes.
Quando valorizamos nossos talentos, efetuamos o recrutamento internamente e temos as seguintes vantagens:
- É mais econômico, evita despesas com anúncios, honorários de empresas de recrutamento, custos de atendimento a candidatos, custos de admissão, integração etc.
- É mais rápido, dependendo da possibilidade do colaborador ser transferido ou promovido de imediato, e evita as demoras frequentes do recrutamento externo.
- Apresenta maior índice de validade e segurança, pois o candidato já é conhecido, avaliado durante certo período de tempo e submetido à apreciação dos chefes envolvidos
Por outro lado, recrutar pessoas externas também tem suas vantagens:
- Traz experiências novas e pessoas motivadas para a organização.
- Renova e enriquece os recursos humanos da organização.
- Aproveita os investimentos em preparação e desenvolvimento de pessoal efetuados por outras empresas ou pelos próprios candidatos.


Percebemos que o banco de dados é a alma do processo de recrutamento e seleção. O que a senhora destaca para o controle, a atualização e a conservação do banco?
O banco de dados deve seguir uma construção que facilite a área de Gestão de Pessoas para buscar seus potenciais candidatos quando necessário. Deve ter um filtro onde os profissionais da área possam separar por cargo, escolaridade e especialização. Podemos fazer um banco tanto para profissionais internos como também externos. É interessante que ele seja renovado entre seis meses a um ano e que as pessoas cadastradas atualizem seus dados sempre ao término de algum curso, assim os dados ficam sempre atualizados. Lembramos que a maioria das instituições possui em seu endereço eletrônico na web o link ‘trabalhe conosco’.


Quais os instrumentos utilizados na seleção de pessoal? Existe algum grau de importância?
Devemos ter em mente que selecionar é uma atividade de extrema importância e responsabilidade e que deve ser pautada sempre por instrumentos com comprovação científica. E sempre que utilizado testes psicológicos, que sejam os validados pelo Conselho Regional de Psicologia (CRP) e feito por profissionais com a devida técnica e capacitação para tal. É muito comum ouvirmos as pessoas dizerem que selecionar é fácil e que “todos sabem fazer”. Estamos lidando com seres humanos em um momento de muita vulnerabilidade, portanto o profissional deve ser consciente e responsável de seu papel. Dentre os instrumentos e técnicas utilizados podemos citar:
- Entrevista – Dirigida (com roteiro) ou não dirigida (livre);
- Provas de conhecimentos – Gerais ou específicas;
- Prova Prática;
- Testes de Personalidade – Expressivos projetivos e inventários;
- Técnicas de simulações – Psicodrama ou análise situacional, dinâmica de grupo;
- Estudo de Caso;
- Entrevista com a chefia imediata.
Hoje, as técnicas mais utilizadas são dinâmica de grupo, entrevista e conhecimento específico.
Geralmente, encaminha-se para entrevista com o requisitante três candidatos por vaga solicitada, ampliando as possibilidades de escolha.

“selecionar é uma atividade de extrema importância e responsabilidade”


A entrevista é muito importante para definir o profissional para a vaga. Qual recomendação à senhora sugere aos nossos internautas?
No papel de entrevistado: mostre o melhor de você. Não minta, não diga o que não é, não fale o que não sabe, enfim... Seja você! Seja sincero e autêntico.
Claro que sempre vemos sugestões de como se comportar na entrevista com relação à roupa, postura, o que dizer e uma série de “dicas”, porém fica muito nítido para nós. selecionadores, quando isto é artificial. O natural flui... o artificial amarra...
Também é importante que para a entrevista o profissional se intere sobre a empresa, entre em seu site, veja sua proposta de gestão de pessoas, conheça sua história, sua cultura, missão, visão e valores. Afinal, a seleção é um processo de mão dupla e é importante que o candidato também saiba sobre a empresa para poder fazer sua escolha.
No papel de entrevistador: o entrevistador deve ser respeitoso, realmente se focar na vaga, fazer perguntas que tenham conexão com o cargo que a pessoa vai atuar, sem ser invasivo. Deve entender, agir e acolher as pessoas enxergando tanto o lado humano como o físico, isto é, ter instalações adequadas para receber o candidato que garanta na hora do processo o sigilo e o respeito à privacidade. Deve, acima de tudo ser justo, tendo clareza dos critérios que estão sendo utilizados para a escolha e deixar isto claro para as pessoas que estão participando do processo, para que não tenham dúvidas. Não esquecer, lógico de dar o feedback ao término do processo.
O entrevistador deve deixar à disposição todo o material a ser utilizado, inclusive lendo antecipadamente atentamente todo o laudo de gestão de pessoas. Deve-se planejar o tempo suficiente e ser pontual, procurando deixar o entrevistado à vontade. A entrevista deve ser conduzida com naturalidade e não como interrogatório, incentivando o entrevistado a falar, criando um clima favorável e de receptividade. Deixe-o discorrer sobre suas atividades profissionais, só fazendo interrupções, se necessário, visando o entendimento de suas falas. Em caso de dúvidas, aborde com detalhes. Saiba ouvir, sem interromper ou cortar o raciocínio. Permita o silêncio, mas evite pausas prolongadas.
Evitar pré-conceitos e ser imparcial é fundamental para evitar influenciar-se por estereotipo. Seja empático, respeite o entrevistado.
Finalmente, evite transformar a entrevista em uma situação de orientação ou discussão. Nunca inverta os papéis e não acabe sendo o entrevistado.


O que a senhora poderia nos falar sobre a prova teórica?
Ela é muito importante, pois medimos o conhecimento da pessoa com relação à atuação na vaga em aberto. Mas temos que lembrar que o processo seletivo é um conjunto de ferramentas. Temos que compor este dado nas demais fases do processo de seleção para que possamos ter a avaliação total.
Nos hospitais em que trabalhei, todos aplicavam prova teórica e, claro, tínhamos uma linha de corte bem significativa e muito cuidadosa, de modo que as pessoas reprovadas realmente não sabiam o básico necessário.
É importante que tenhamos vários tipos de provas para um mesmo cargo, pois sempre algum conhece alguém que já passou pelo processo seletivo e acaba dando as “dicas do que cai na prova”. Caso prefira, elenque umas 100 questões e sorteie 10 a cada prova, assim você terá muitas possibilidades de provas diferentes.
É importante que as provas sejam específicas para a vaga em questão, por exemplo, se a vaga é para a CME, tenho que ter questões específicas para a área para que realmente eu possa medir o conhecimento do candidato. Dê preferência também por provas com perguntas abertas, pois assim você já observa a coerência do discurso escrito, raciocínio, caligrafia dentre outros.


A senhora é a favor da prova prática? Por quê?
Sou totalmente a favor. Principalmente na área da saúde. Vivenciei esta prática em hospitais que trabalhei e o resultado é bem positivo. Na área de Enfermagem a prova era acompanhada pela enfermeira da Educação Permanente. Pela Consolidação das Leis Trabalhista (CLT) podemos aplicar a prova prática com até três horas de duração. Durante este tempo verificamos como o profissional atua e como ele aplica os princípios científicos. A prova deve ser individual evitando, assim, a exposição do profissional. Lembramos que as especificidades de processos de cada instituição devem ser explicadas aos candidatos ou não computadas na avaliação.


Em quais situações a dinâmica de grupo pode ser utilizada?
A dinâmica de grupo pode ser aplicada no processo seletivo de qualquer cargo, desde que sejam observadas as competências pertinentes à vaga. O número ideal de participantes é de, no máximo, 25 e no mínimo 15.


Sobre o acolhimento das pessoas que participam do processo de seleção, o que a senhora poderia nos falar?
Temos que tratar a todos com muito respeito, atenção e cuidado. Ser empático, atencioso e preparar o ambiente para receber as pessoas. Ser pontual, não deixar o candidato esperando, deixar claro todos os passos do processo e efetuar todos os passos no mesmo dia, na medida do possível, evitando que a pessoa retorne muitas vezes para o processo. É importante que todo o processo seja claro ao candidato, devemos explicar todas as fases e quais as condições destas fases, isto é, se elas são classificatórias ou eliminatórias. Este esclarecimento faz com que o candidato tenha a visão real do processo, eliminando a possibilidade de gerar falsas expectativas.


Solicitar referências do candidato é uma boa pratica?
A solicitação ou não de carta de referência aos candidatos deve ser uma decisão do gestor porque requer uma avaliação bem criteriosa sobre o motivo que leva a esta solicitação. Durante o processo de seleção, na parte que tange a gestão de pessoas, utilizamos, como já falamos anteriormente, de uma séria de ferramentas que nos permite avaliar e analisar os candidatos. Caso alguma questão referente à atuação deste candidato em outra instituição gere dúvida ou controversa, lançamos mão deste recurso. Porém, se durante o processo seletivo o candidato não nos deixa dúvidas, este recurso não é utilizado, pois se faz desnecessário. Devemos ressaltar que uma avaliação de carta de referência fora de um contexto pode levar a julgamento errôneo. Reafirmo que o processo de seleção é um conjunto de recursos/ferramentas utilizadas para análise e avaliação do candidato, portanto nada isoladamente faz sentido.


Qual a sua sugestão para contato dos reprovados no processo?
Toda pessoa deve receber um feedback do processo que pode ser feito por carta ou por telefone. Vale lembrar que se a pessoa pedir uma devolutiva do processo temos que fazê-lo, pois todas as informações levantadas pertence à pessoa e ela tem o direito de saber. Sugiro que os candidatos reprovados sejam mantidos em arquivo por seis meses.


Como podemos definir perfil, competências e requisitos do cargo?
Percebemos que a Gestão por competência a cada dia vem tornando-se uma prática. Uma vez ela instalada permeará por todos os processos de gestão de pessoas. Desta forma, teremos as competências comportamentais e técnicas exigidas para cada cargo que somada às competências organizacionais definem o perfil do cargo. Com relação a requisitos, podemos usá-lo para expressar, por exemplo, a escolaridade necessária, especializações, enfim, como parte para compor o perfil do cargo.


Quais os principais indicadores do processo de recrutamento e seleção de pessoal?
Temos que nos atentar ao cenário ao qual estamos inseridos, como ele está se comportando e quais as tendências. Para esta visão, os números sempre nos ajudam. Cruzar números de candidatos convocados para uma determinada vaga X número de pessoas que compareceram X número de aprovados X número de aprovação após experiência é um bom dado para trabalharmos custos e o resultado do departamento de Gestão de Pessoas. O índice de rotatividade também merece uma avaliação e análise.


Nas instituições públicas o processo ocorre por concurso público, cujo início se dá pelo edital. Qual a sua orientação para a elaboração de um bom edital?
O bom edital é aquele que expressa claramente a necessidade da empresa. Deve ser objetivo e realmente conter todos os requisitos para a vaga em aberto ou para vaga reserva. Certificar-se que a prova de conhecimento realmente retrará a realidade vivenciada no cotidiano.
Sei que o que falarei não é a concepção de todos, mas neste processo falta a avaliação do potencial comportamental das pessoas. Todo bom profissional é composto pela técnica, pelo comportamento e por suas possibilidades de desenvolvimento. Se observarmos somente um aspecto, a avaliação fica parcial e prejudicada.
Ressalto a importância da área requisitante em todo o processo seletivo e no caso específico da enfermagem, o papel do enfermeiro, definindo em conjunto com gestão de pessoas o perfil dos colaboradores, as atividades a serem desenvolvidas nos diferentes departamentos e unidades para que a escolha do candidato adequado a vaga.

“Todo bom profissional é composto pela técnica, pelo comportamento e por suas possibilidades de desenvolvimento”


Quais as referências bibliográficas que a senhora indica aos internautas que estão iniciando na área ou desejam aprimorar seus conhecimentos?
Hoje, temos muitos periódicos e endereços eletrônicos que discutem a temática, mas, cito algumas obras que utilizo como referência nos meus cursos:
- Captação e seleção de talentos (Almeida, Editora Atlas)
- Seleção: princípios e métodos (Carvalho, Editora Pioneira)
- Planejamento, recrutamento e seleção de pessoal: como agregar talentos à empresa, (Chiavenato, Editora Atlas)
- Desempenho humano nas empresas (Editora Manole)
- Ética na gestão de pessoas: uma visão prática (Farah, EI-Edições Inteligentes)
- Seleção por Competência (Rabaglio)


Finalizando nossa entrevista, a senhora gostaria de enfatizar algo para os profissionais da área?
Sim, agradeço a oportunidade e reforço:
Pontos importantes para processo de recrutamento e seleção:
- Ter a descrição detalhada do cargo da vaga em aberto;
- Conhecer os pré-requisitos, competências e perfil comportamental esperado/desejado da vaga em aberto;
- Conhecer os principais desafios esperados pela área solicitante;
- Conhecer a cultura, os valores e os princípios, não só da empresa, mas da área, bem como da equipe da vaga em aberto;
- Conhecer (e entender) a missão, a visão, os objetivos estratégicos, os princípios da empresa para não contratar “um estranho no ninho”;
- Buscar sempre a participação do solicitante da vaga. Sem esta participação o processo seletivo ficará comprometido.

Devemos compreender que:
- A tarefa de recrutar e selecionar profissionais é estratégica;
- Esta atividade deve ser de responsabilidade da área de Gestão de Pessoas, pois ela está preparada para identificar os potenciais, visto que recrutar e selecionar pessoas no mercado é uma atividade com metodologia própria e não pode ser encarada como um evento pontual, subjetivo e sem importância;
- Uma seleção bem feita minimiza os processos de treinamento, pois não existe treinamento que dê conta de uma seleção mal feita.

Gostaria de encerrar com uma reflexão aos líderes:
O papel do processo seletivo é de assessorar as lideranças oferecendo um instrumental para que o requisitante possa melhor decidir. Selecionar, não é atividade restrita a um profissional normalmente alocado na área de Gestão de Pessoas. É uma responsabilidade eminentemente gerencial. Isto é, cabe a cada líder, a cada gerente ter a competência para escolher com quem vai trabalhar.


Costa M. Portal da Enfermagem – Recrutamento e Seleção de Pessoal [internet] 2011 [citado 2011 Setembro 01]. Disponível em http://www.portaldaenfermagem.com.br